O mundo cristão católico viveu recentemente um tempo muito forte de celebrações e aprofundamentos sobre a vida, vocação e missão do Apóstolo das Nações, Paulo, bem como seguir os seus passos e se apaixonar ainda mais por Cristo. A experiência de Paulo com Cristo o fez afirmar: “(...) e já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim” (Gl 2, 20a). Ousar tamanha declaração é adentrar no mistério apaixonado de Cristo e se deixar ser transformado por Sua presença, como fizera Paulo. A Igreja, na pessoa do santo padre, abriu, depois deste forte tempo paulino, um ano de celebrações e aprofundamentos, desta vez dedicado aos sacerdotes. O Ano Sacerdotal chega num momento muito oportuno devido ao desgaste da imagem sacerdotal num mundo tão secular, como o nosso. A demasiada ênfase midiática nas fragilidades dos ministros de Deus têm tornado a vida clerical amarga, onde a experiência religiosa parece estar desacreditada e, portanto, a importância e a compreensão acerca da figura sacerdotal tornam-se supérfluas.
A celebração do Ano Sacerdotal é um convite a todos os cristãos a renovar o compromisso de batizados e assumir a condição de sacerdotes (comum), profetas e reis. Mas, acima de tudo, é um resgate da imagem verdadeira do sacerdócio ministerial, do sacerdote como “Testemunha evangélica e Amigo fiel de Jesus” olhando para o exemplo do Santo Cura D”Ars, São João Maria Vianney. Em virtude dos 150 anos da morte deste sacerdote, o santo padre ao abrir o ano sacerdotal “pretende contribuir e fomentar um empenho de renovação interior em todos os sacerdotes para um testemunho evangélico mais rigoroso e incisivo”, como ele mesmo explicita em sua carta sobre o Ano Sacerdotal. Contudo, vincular o Ano Sacerdotal à vida de São Vianney foi providencial, pois o testemunho deste grande sacerdote tem muito a ensinar aos nossos sacerdotes contemporâneos, em especial, pelo seu exemplo de vida ministerial dedicado a escuta do povo de Deus, a seriedade no exercício de seu ministério, a sua identificação com Cristo, o Sumo Sacerdote, e a sua opção pelo Reino.
Vianney afirmara que: “O sacerdote é o amor do coração de Jesus”. Esta afirmação nos coloca diante da importância para a Igreja e para o mundo, do sacerdote como aquele que envolvido pelo mistério de Deus, nos traz sua graça e o seu agir salvífico. Nos escritos de Vianney encontra-se também, seu amor e identificação pelo ministério que possibilita uma identidade com o próprio Cristo em sua Pessoa e Missão, assim como Jesus se identifica com o Pai, o sacerdote é chamado, acima de tudo, a se identificar com Cristo e assumir a sua missão salvífica.
“Se compreendêssemos bem o que um padre é sobre a terra, morreríamos, não de susto, mas de amor. (...)”. A grandeza do ministério sacerdotal levava o Cura D’Ars a compreender a figura do padre como uma pessoa que tem a chave que abre a porta de uma casa cheia de ouro, tamanho é o valor da vida sacerdotal. O padre é o cuidador das coisas de Deus e o coração acolhedor das almas. O padre não é padre para si mesmo, mas para o povo. Portanto, que seja dada aos nossos sacerdotes a graça de assimilar o método espiritual e pastoral de Vianney: dotado de um dom especial, na sua humildade e paciência levava a todos que exaustivamente o procuravam, a misericórdia e ao amor profundo de Deus. Vianney habitava, literalmente em sua paróquia, passava um grande tempo atendendo confissões. O zelo pelo confessionário e o atendimento espiritual era alimento para o seu ministério, chegava a dizer que na confissão não é o pecador, em primeiro lugar, que volta-se para o seu pecado e vai ao encontro de Deus, mas é o próprio Deus que nos alcança em sua misericórdia.
Este Ano Sacerdotal é uma oportunidade, de exemplos distantes e próximos, para os nossos sacerdotes olharem para suas vidas e encontrarem a motivação cristológica e perceberem que é possível ser feliz na opção de vida que fizeram e que zelem ainda mais pela caridade pastoral que lhes foi incumbida, em especial, no zelo pela Eucaristia, que muito tem causado ao povo de Deus escândalo, pela falta de cuidado e de uma vivência. Por isso, a vida de Vianney pode ser um espelho de um justo e fiel sacerdote que compreendia o sacrifício da Santa Missa como um dom diário dado por Deus em que nele o padre também se oferece a Deus. Entretanto, jamais um ritualismo ou cumprimento de uma função profissional.
O sacerdote é o servo de Jesus: ouve seu chamado, se identifica com Ele, segue-o e anuncia-o, como aquele que encontra um tesouro de amor e divide-o com todos. O Ano Sacerdotal é um convite para lembrar e viver um estilo de vida, onde o Cristo chama a estar com Ele, ser fiel e a pregá-lo a todos os cantos. Em palavras mais concretas é recordar as palavras do rito de ordenação quando o Bispo entrega ao sacerdote ordenado o livro dos Evangelhos e diz: “Recebe o Evangelho de Cristo, do qual foste constituído mensageiro; transforma em fé viva o que leres, ensina aquilo que creres e procura realizar o que ensinares” (Rito de Ordenação de Bispos, Presbíteros e Diáconos, 210). Assim, percebemos que na história de vida sacerdotal de Vianney encontramos uma sabedoria espiritual capaz de assumir com verdade e fidelidade os compromissos firmados na ordenação e que levara o Santo Cura a compreendê-los como necessários a vida ministerial. O Santo Cura D’Ars possuía uma castidade em seus olhos fixos na Eucaristia, uma pobreza no tudo para todos e no nada com os que nada têm e uma obediência no oferecimento de sua vida a Deus e a disposição de fazer a sua vontade.
No entanto, que este seja um tempo novo que nos possibilite um aprofundamento da identidade, da teologia sacerdotal e da importância deste ministério para o mundo, bem como uma oportunidade de deter o nosso olhar naqueles muitos sacerdotes que buscam com seriedade e fidelidade viver sua vocação e missão, neste mundo secularizado e obstaculoso. Que este tempo possa ser efervescido de discussões, reflexões, pesquisas e enriquecimento espiritual para toda a vida da Igreja. Que nossos sacerdotes e o nosso povo descubram o valor da opção pelo Reino de Deus, bem como uma amizade pelos pobres e indefesos, excluídos e marginalizados. Este é um tempo também de despertar para a solidariedade e fraternidade sacerdotal, de recordar o primeiro amor pela vocação e de impulsionar e proporcionar ainda mais uma amizade profunda do padre com o povo que lhes foi confiado e do povo com o padre que lhe foi confiado. Contudo, que este tempo favoreça também aos nossos bispos um resgate de sua presença paterna no presbitério para que nenhum sacerdote fique desprovido de sua atenção, seu auxílio e sua palavra, bem como sua exortação e apoio, quando necessários.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe aqui seu comentário